Distância de Santiago: 138km
Após um dia maravilhoso como ontem, não esperávamos o que ia acontecer. Durante a noite, o Clinton teve muito frio, tontura, ficou enjoado, e de repente bateu um febrão. Ai, pronto, será que foi algo que ele comeu? Nah, mas eu comi e bebi exatamente as mesmas coisas. Nossa caminhada foi a mesma, a única coisa diferente é que a mochila dele é um pouco mais pesada que a minha.
Pela manhã, ele parecia melhor. Disse que poderia continuar andando. Pegamos a trilha, ainda bem sombreada, até Triacastela. Depois de uns 7km, ele começou a diminuir o passo, o que não é comum em tão 'pouca' distância.
- Clinton, vc tá bem?
- Eu... eu... eu... (*Imagine asiático pálido aqui*)
Ele tava fervendo. Meio que fui escorando ele até uma igrejinha toda de pedra, bem antiga, e coloquei ele sentadinho encostado na parede geladinha. E fui atrás de ajuda.
Andei até o meio de Triacastela, onde tinha um albergue e um café. No café, expliquei o ocorrido e perguntei onde tinha um ponto de ônibus pra gente ir até Sarria, onde teria hoteis e farmácias. Ele me explicou, ms disse que domingo não passava ônibus em Triacastela. Acho que fiz um cara tão triste q ele chamou uma moça, disse pra ela cuidar do cafe e foi comigo atrás de uma conhecida dele que tinha um táxi.
Após mais umas andadas, ele achou a moça. Ela disse que em 20 minutos estaria com o táxi na frente da padoca. Voltei pra buscar o Clinton e as mochilas, sentamos no café (onde o cara me vendeu um bocadillo parrudo pelo preço do pequeno) e esperamos. moça nos buscou e levou até Sarria, que era nosso destino final para aquele dia. No caminho, passou pelo Monastério de Samos.
- Esse lugar é muito bonito, dizem que é muito santo.
Peguei a deixa, agradeci e disse que iria pedir proteção. E pedi mesmo.
Ela nos deixou na porta do "melhor hotel de Sarria", o Alfonso Noveno. Mas tava lotado. Aí ela apontou onde era o outro, e fomos a pé mesmo porque era em uma vielinhas muito complicadas pra ir de carro. Tava lotado também. Expliquei pra recepcionista a nossa situação, e ela disse que iria ligar pros outros hotéis e pousadas até achar um quarto pra nós, já q era caso de saúde. (Veja que nesse tempo todo, o Clinton está pálido e mudo ao meu lado, coitado, sendo meio que arrstado pra cima e pra baixo. Assim como as mochilas.)
Aí ela achou uma pousada que tinha vaga. A Escalinata. O nome me deu a indicação que algo viria por aí... A pousada era no alto de uma 'escalera', ou escadaria. E lá vamos nós, menino doente, mochilas, Pá usando todos seus musculozinhos, escada acima pra chegar no hotel.
Quando chegamos, o seu José já estava na porta nos esperando.
-Ah, vocês que precisam de ajuda, né? Suzana, arruma esse quarto depressa que é emergência! Entra, menina, põe ele sentado. Pega uma água! Come um pão. COME UM PÃO QUE FAZ BEM. TÁ PRONTO O QUARTO? Foi o sol, é? Tá esgotado o coitadinho. Come mais um pão e PEGA UMA ÁGUA, COME UM QUEIJO TAMBÉM. QUE HORA PRA TOCAR O TELEFONE!
O seu José foi uma das pessoas mais barulhentas que já vi na vida. Mas era um anjo. Arranjou um quarto arejado, com banheiro, toalhas, garrafas de água, pão e queijo pra nós. ("COME UM PÃO VC TBM, MENINA, que vc não pode ficar fraca agora"!)
O Clintou dormiu até o fim da Siesta, e eu fiquei cuidando dele. Nossa conclusão é q ele caiu com insolação, de subir a montanha ontem, no sol, com peso nas costas. Erro básico, e aprendemos do pior jeito q existe um motivo muito sério para a siesta: o sol daquele horário derruba até os fortes. Como q eu não senti nada? Não sei. Carreguei menos peso, usei meu casaco por mais tempo (aí a pele não queimou)... Ou o destino queria nos testar e ensinar algo mas sem ferrar nossa viagem: deixou um dos dois em pé.
Depois de um bom descanso, bastante água e pão salgadinho, fomos até a igreja de Sarria para marcar nossa credenciais (e pedir saúde e proteção, né?). A fila de peregrinos era grande, mas chegando lá eu logo vi q ficaria tudo bem: a igreja era dedicada a Santa Marina (de todos os santos possíveis!) e tinha uma capela dedicada ao Senhor dos Passos, que em Floripa é mega importante e meu avô respeitava muito. Coincidências? Talvez. Mas foi emocionante estar berta a receber qqr alento possível e dar de cara com dois nomes tão próximos ao coração.
Comemos na Casa Manuel, recomendadíssima pela comida boa e pelo carinho da moça q nos atendeu em fazer uma comidinha levinha, do jeito q precisávamos.
Quando voltamos para o hotel, mais um lição a ser aprendida: o seu José nos recomendou ligar para o "Mochilas Davi", uma empresa que recolhe sua mochila/mala no hotel e leva até sua próxima parada. Nos primeiros dias da viagem, eu tinha achado esse serviço muito engraçado e que era "trapacear" no caminho mandar sua mochila de carro. E aí o Caminho mais um vez me fez ver que cada um tem sua própria história, e que não me cabe julgar. Eu ri do Mochilas Davi, e agora eu precisava deles. Mesmo estando melhor, eu não arriscaria, por nada, dizer pra ele carregar a mochila de novo no dia seguinte até ter certeza que ele estava bem.
Reservei pelo tablet um quarto numa pousada na cidade onde pretendíamos chegar no dia seguinte e avisei que os Mochilas Davi iam pra lá. A moça disse quue tudo bem, que muita gente fazia isso e eles estavam acostumados a cuidar de mochilas até os donos aparecerem. Eram quase 11 da noite quando fomos dormir, com o sol ainda brilhando.
2 comentários:
Nossa, que post lindo! Fiquei emocionada. Viva Santa Marina e Senhor dos Passos e seu vovô. ♥ (limpando os olhinhos pra escrever)
Ana Paula, certamente o vô Beto estava junto....
e eu com lágrimas nos olhos lendo....
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